Arthur Ferraz: Compromisso da Vela ao Swimbikerun

Em entrevista, um dos melhores triatletas amadores brasileiros fala de sua trajetória ao migrar da Vela esportiva para o Triathlon

Dono de grandes resultados no triathlon amador e temido pelo seu ciclismo de alto nível, o psicólogo Arthur Ferraz, de 40 anos, conta em entrevista como saiu da Vela esportiva para o swimbikerun, onde é presença constante no pódio de provas brasileiras e até internacionais.

Como chegou ao triathlon?
AF: Embora sempre tenha praticado esportes na infância, considero a Vela o meu esporte principal. Entre 1994 e 2006 foi minha prioridade em termos competitivos. Velejei em diversos barcos como a classe Laser, onde fui campeão paulista e vice-campeão brasileiro Jr; 49er, em que realizei a campanha olímpica para os Jogos de Sydney 2000, embora não tenha me classificado; e na vela oceânica, onde venci importantes competições como o Campeonato Paulista e a tradicional Semana de Vela de Ilhabela, com Jorge e Jorginho Zarif, e o Campeonato Brasileiro, com Robert Scheidt como timoneiro no barco. E foi justamente ao final da campanha olímpica de 2000, quando troquei os barcos olímpicos pela vela oceânica, onde os treinamentos diários passaram a ser apenas nos finais de semana, que fui procurar uma atividade que me permitisse manter treinos físicos intensos, quando não estava velejando. O triathlon me foi apresentado por um companheiro de barco, que já pedalava e se interessava bastante pelo esporte, e como ele era sócio do clube Pinheiros também, ele me disse: “Tem um técnico meio louco que dá treinos de triathlon no clube, se você aguentar os treinos é só conversar com ele. E foi então, em 2001, que conheci Luiz Gandolfo, que é meu técnico até hoje, numa equipe que contava na época com Antonio Manssur, Alexandre Giglioli e Duda Bley, caras que desde o início foram uma inspiração para mim.

Qual foi sua primeira prova de Triathlon?
AF:
Minha primeira prova de triathlon foi o Troféu Brasil, em Santos, 2001, e até hoje para todos os atletas que iniciam digo que foi um marco de o quanto um treino disciplinado e a consistência de anos podem te levar aonde quiser. Embora tenha vindo de uma prática esportiva de alto nível, as habilidades técnicas da Vela não me serviam em nada para as exigências do triathlon. Sofria pra nadar, era fraco no pedal (embora tenha sido sempre meu ponto mais forte) e corria mal demais. Lembro que era a primeira semana de dezembro e estava quente demais. Corri, trotei, andei, vomitei, quis desistir mas fui até o final, terminando a prova em mais de 1h35min. Vejo as meninas da equipe iniciando com tempos mais rápidos, mas naquele momento decidi que aquele era o esporte que queria fazer e que faria o necessário para um dia conseguir fazê-lo bem.

Quais provas guarda as melhores recordações?
AF:
Acredito que independente de tempo, o que faz uma prova ficar na lembrança é a certeza de que fui capaz de fazer o meu melhor e dar meu máximo. Entre as provas que considero mais importantes estão minha primeira vitória em categoria no Troféu Brasil; meu primeiro Mundial ITU, em Hamburgo em 2007; o título mundial de Aquathlon na categoria, em Monterrey 2008; a primeira vez que me classifiquei para o Mundial de Ironman, no Ironman Brasil de 2013, onde depois de duas participações fui o segundo amador geral, com o tempo de 8h58min; minha primeira participação no Ironman do Havaí, em 2013 e a prova de Kona em 2015, quando saí para correr em 5º lugar geral entre os amadores, terminando na 12ª colocação na categoria. Outra prova marcante foi um Long Distance em Caiobá, num dia em que tudo deu certo e lembro de disputar a corrida com atletas do nível do Manssur, Adriano Sacchetto e Chicão Ferreira. mas gosto de valorizar sempre o que é possível, portanto, também tenho provas em que o resultado final nem foi dos melhores, mas tenho a nítida lembrança de trechos da prova em que realmente pude sentir que estava fazendo o meu melhor. Afinal se você não é capaz de valorizar as pequenas conquistas, fica muito mais difícil esperar que tudo dê certo, para então valorizar o resultado final. Nunca podemos deixar que uma vitória esconda aquilo que precisa ser corrigido, assim como não podemos deixar com que as derrotas escondam tudo o que fizemos de bom e certo.

Como é sua logística e divisão com o trabalho de psicólogo e família?
AF:
Acredito que o maior desafio do atleta amador é encontrar o equilíbrio entre treinos, trabalho e família. E talvez parte deste erro seja acreditar que é possível dividir nosso tempo em três terços e nos dedicarmos igualmente a cada um destes focos. Eu tento organizar minhas atividades de acordo com a prioridade do momento, a proximidade da prova, as necessidades práticas de cada momento. Tenho a sorte de minha esposa ser triatleta também, aliás, mais do que eu… mas sempre procurei mostrar para ela a importância da dedicação aos treinos em um período pré-prova, e que após a prova essa qualidade de tempo seria diferente. Em relação ao trabalho, em termos de demanda de tempo, consigo organizar minha agenda de atendimentos em relação aos horários de treino, e como trabalho com atletas, o que acabo aprendendo com eles também sempre me ajuda em minha própria atividade competitiva. Mas o caminho é sempre o da organização, da definição de prioridades, da negociação e da disciplina. Aliás, disciplina e rotina é o que me permite ser capaz de sair para treinar, pela terceira vez no dia, mesmo depois de dias cansativos nos treinos e trabalho.

Que provas havia programado para 2020 e quais ainda pretende fazer?
AF:
Eu tinha como planos a participação no EVtri, no Ironman 70.3 de Florianópolis e no Ironman Brasil. Ainda farei estas provas se ela puderem ser realizadas, mesmo que não consiga estar treinado como gostaria, vou gostar de voltar a treinar, e acompanhar a minha evolução e perceber o quanto conseguirei evoluir desde o momento em que os treinos normais voltarem até a data da prova. Mesmo que seja mais difícil e sofrido do que estou acostumado. Mas mesmo assim não estou preocupado neste momento em “se” e “quando” as provas retornarão. Elas continuarão quando for possível e eu sempre estarei aqui para treinar novamente e continuar buscando a evolução.

Quais seus objetivos no esporte?
AF:
Entre os objetivos tenho sempre alguns importantes para buscar. Competitivamente sempre quero ganhar e acredito que seja possível, tanto em provas locais e regionais, quanto nos campeonatos mundiais, no meu age group. É lógico que preciso melhorar muita coisa ainda, mas mesmo que dê trabalho e exija tempo não há nada que não acredite que possa fazer melhor. Em relação a isso o objetivo maior é sempre o de evoluir, seja no tempo, enquanto for possível na colocação, na faixa etária, ou mesmo em perceber que com mais dificuldades consigo executar algo melhor do que antes. E buscando isso, dia após dia, ano após ano, continuo motivado a treinar sempre. Outro objetivo importante é continuar praticando o esporte e mantendo-o sempre como algo importante para mim, fonte de alegria, prazer, amigos, satisfação e evolução.

Que dicas – no aspecto mental – pode dar para alguém que vai iniciar no triathlon?
AF:
Meu principal conselho é o de pensar no sentido do que se está fazendo, antes de pensar em um objetivo em si. Um título, um tempo, uma prova ou uma vitória não fazem ninguém diferente. É a busca do sentido da atividade que traz a verdadeira satisfação. Não dá pra vencer sem melhorar, não dá pra melhorar sem treinar duro, não dá pra treinar duro sem saber treinar, e treinar sem gostar do que está fazendo não faz sentido algum. E isso não quer dizer gostar de sofrer, mas entender que o sofrimento e a dificuldade muitas vezes vão fazer parte deste caminho que vai tornar este atleta um atleta melhor e uma pessoa mais realizada. Por isso tenha paciência, trabalhe o processo, curta cada conquista e cada evolução, não se apresse e ao invés de tornar todo o trabalho realizado em pressão competitiva, aprenda a perceber este trabalho como oportunidade para o melhor desempenho.

O triathlon é um esporte com uma relação muito direta entre o treinamento, a capacidade de execução e o resultado. Se você faz o treino da maneira necessária, a evolução virá. O grande desafio então é conseguir entender o que é essa maneira necessária. É preciso entender que tem muito mais a ver com o comprometimento, a atitude a entrega e a consciência do que com pace, VO2 Máximo, FTP, tempos, intervalos ou qualquer fórmula de prescrição do treinamento. Algo simples, mas de maneira nenhuma fácil de se alcançar. Tenho aprendido isso durante os anos, com tentativas, acertos, muitos erros e falhas e principalmente com todos os amigos e adversários que tenho tido o prazer de disputar as provas. Cada novo atleta disposto a desafiar a prova e vencer, me ensina algo novo, me mostra novos possíveis, muda meus referenciais e vai me tornando um atleta melhor. E conseguir olhar para os adversários desta forma e não como alguém que quer te impedir de alcançar seu objetivo, ou deseja lhe trazer frustração é outro segredo da longevidade no esporte e da possibilidade de valorização de tudo o que faz parte deste mundo.

BIO
Arthur Ferraz
Idade: 40 anos
Cidade: São Paulo
Tempo de triathlon: 19 anos
Altura: 1.78m
Peso: 70 kg
Roupa de Borracha: Roka
Óculos de natação: TYR
BIke: Specialized Shiv Disc
Sapatilha: Specialized S-works 7
Capacete: Specialized Evade, S-works TT MacLaren
Tênis de treino: New Balance 1500
Tênis de prova: Hoka Carbon X
Óculos de sol: ROKA SL
Equipe: E.C. Pinheiros/ Ironcrazy’s
Apoio: Pedal Power/Specialized/Join

Deixe seu comentário

comentários

Redação

press@trisportmagazine.com